Um estudo sobre MPC’s
Autora: Maria Isabel Landim Neves
A demanda por produtos ricos em proteínas tem aumentado devido ao interesse crescente em estilos de vida saudáveis e práticas alimentares voltadas para atletas e pessoas que buscam uma dieta equilibrada.
O concentrado proteico do leite (MPC) é amplamente utilizado na indústria de alimentos e bebidas, especialmente em produtos como barras de proteína, suplementos nutricionais, shakes, produtos lácteos fortificados e padronização do teor proteico de produtos lácteos. As proteínas do leite em pó com um teor de proteína inferior a 90% com base na matéria seca são definidas como concentrados, que seria o concentrado proteico do leite (MPC). Aquelas com um teor de proteínas de acima de 90% são conhecidas como isolados, no caso das proteínas do leite: isolado proteico de leite (MPI)1. As produções de MPC e MPI em laboratórios de pesquisa foram iniciadas por volta de 1990 2.
O MPC é produzido por ultrafiltração ou ultrafiltração + diafiltração (em maiores concentrações de proteína) por membranas. O produto apresenta uma proporção entre caseína e proteína do soro do leite equivalente à do leite padronizado (aproximadamente 80:20). As proteínas no MPC permanecem em estado similar ao leite cru, retendo propriedades funcionais nativas devido à aplicação de temperaturas moderadas 2.
Em geral, conforme o teor proteico dos MPCs aumenta, os níveis de lactose diminuem. Por exemplo, o leite desidratado sem gordura (NDM) se apresenta com 34% a 36% de proteína e 52% de lactose, já o MPC 42 contém 42% de proteína e 46% de lactose, e o MPC 80 contém 80% de proteína e 5% a 6% de lactose2,3. Produtos à base de MPC são identificados por um número que representa seu teor proteico, como podemos observar na Tabela 1.
Tabela 1. Diferentes concentrados proteicos de leite e respectiva composição centesimal. Dados 3
Dos diferentes teores de MPC no mercado, categoriza-se esses produtos da Tabela acima em três tipos principais: (a) MPC com baixo teor de proteína (até 40% de teor de proteína), (b) MPC proteína média (60-70% de teor de proteína) e (c) MPC com alto teor de proteína (acima de 80 % de teor de proteína)3.
Em relação a produção de MPC, de acordo com Euromonitors, sob um panorama mundial, o mercado global de MPC produz uma média de 38 mil toneladas/ano, desde 2018 (Figura 1). Tal produção corresponde a 11 bilhões de dólares em 20221,6. Há uma expectativa futura de faturamento de 19.7 bilhões de dólares em 2032. Com uma taxa de crescimento (CAGR) de 5.6% entre 2022 e 20326.
Figura 1. Produção mundial de MPC por ano. Dados:1
A região com produção e participação do mercado com maiores taxas é a América do Norte, no qual EUA lidera a produção com uma média de 18 mil toneladas/ano. Apesar de que, a América Latina também apresenta expressiva projeção de crescimento do mercado. Em Latino-américa, o volume total de MPC produzido em 2023 foi 621 toneladas, sendo o Brasil responsável por 45% dessa produção1,3. A Figura 2 mostra o crescimento da produção de MPC no Brasil (em toneladas) ao longo de 5 anos (2018-2023).
De todos os concentrados do leite, o MPC 80 é atualmente o mais comercializado. O quilo do mesmo no Brasil pode ser comercializado entre 100 e 200 R$. Nos Estados Unidos o preço médio do MPC 80 está em torno de 10 a 20 $ por libra, equivalente a 22 a 44 R$ o quilo (dados de fontes confidenciais).
Quanto ao consumo e aplicação, no mercado de proteínas do leite, quem vence é o concentrado proteico do soro do leite (WPC), uma vez que em muitos processos de produção de derivados lácteos o soro de leite é um co-produto. Em segundo lugar o mercado é das caseínas, sobretudo o caseinato. Porém, o MPC tem ganhado força ao longo dos anos e mais demanda de mercado. É importante considerar que a comercialização de MPC é relativamente recente comparado ao WPC e caseinato. Apenas em 2014 o American Dairy Products Institute (ADPI) e o U.S. Dairy Export Council (USDEC) solicitaram conjuntamente a notificação de “Geralmente Reconhecido como Seguro” (GRAS) para utilizar MPCs e MPIs como constituintes alimentares3. Após 6 anos, em junho de 2020, o FDA decidiu permitir a inclusão de MPC e MPI como aditivos em produtos marcados como “leite rico em proteínas”. Já o caseinato e WPC foram notificados como GRAS em 1970 e 2006, respectivamente. Portanto, devido ao histórico recente, o MPC e MPI ainda serão impulsionados para crescer no segmento de mercado nos próximos anos8.
A questão, portanto, é imaginar um cenário distinto, onde o recente MPC poderia atingir maior consumo frente ao WPC e caseínas. Este cenário é possível uma vez que o MPC apresenta algumas vantagens: O mesmo apresenta relativamente mais proteínas não desnaturadas, pois o seu processo de produção não envolve tratamento térmico, nem ajuste de pH4. Assim, o produto resultante tem uma proporção de caseína para proteína de soro de leite igual à do leite integral e as proteínas permanecem no seu estado nativo, o que permite que os MPCs forneçam as propriedades funcionais desejadas. Ademais, o MPC contém menor teor de gordura do leite, lactose e minerais, tornando-o mais adequado para aplicação em produtos alimentícios especiais (alimentos para bebês e crianças, suplementos para atletas). Outra vantagem é a maior possibilidade de diferentes concentrações, flexibilizando assim sua aplicação e variação de preço.
A solubilidade é uma propriedade funcional chave dos pós e afeta outras propriedades como formação de espuma, emulsificação e gelificação. A baixa solubilidade é devido ao conjunto de processos: UF, DF e secagem que alteram o equilíbrio salino entre as fases coloidais e solúveis do sistema de estabilização de proteínas do MPC e MPI4. Várias estratégias podem ser usadas para lidar com esse problema:
-Modificação química: Certas técnicas de modificação química podem ser aplicadas para melhorar a solubilidade do MPC, como hidrólise enzimática ou tratamentos ácidos, antes da secagem.
-Uso de emulsificantes e estabilizantes: Adicionar emulsificantes e estabilizantes pode ajudar a melhorar a solubilidade do MPC em certos produtos, especialmente em bebidas e misturas em pó.
-Controle de pH: Ajustar o pH durante o processamento pode ajudar a melhorar a solubilidade do MPC em certas aplicações.
-Mistura com outras proteínas: Combinar o MPC com outras fontes de proteína, como whey protein, pode ajudar a melhorar suas propriedades de solubilidade.
-Adição de microparticulado de WPC: o microparticulado produzido com a desnaturação do WPC por tratamento térmico seguido de cisalhamento pode ser misturado ao MPC e aumentar a propriedade de solubilidade.
Uma vez que cenário do mercado do MPC é bastante promissor, as empresas estão investindo em tecnologias de processamento avançadas para melhorar a eficiência da produção de MPC e garantir a qualidade do produto final. Pesquisas têm sido focadas em novas formulações de MPC com propriedades funcionais aprimoradas, sobretudo em relação ao aumento da solubilidade do MPC em pó, e aplicações mais amplas na indústria de alimentos e bebidas4.
Outro ponto importante a se considerar, que dá mais lugar ao uso do MPC frente aos outros concentrados proteicos lácteos, é o uso de compostos lácteos separados por membrana para padronização de macronutriente de produtos. Tanto o MPC, como o permeado do MPC que é posteriormente concentrado por osmose reversa, são usados para padronização. O permeado é usado para padronizar proteína de leite em pó, em ocasiões em que a proteína está acima do mínimo exigido pela legislação. E, consequentemente, o MPC, concentrado do processo de Ultrafiltração, é usado para padronizar o teor de proteínas em queijos, quando o teor proteico da massa é menor que o esperado. Tal padronização aumenta o rendimento de produção de queijo.
Os MPs estão sendo usados em diversos produtos, como queijo, produtos lácteos cultivados, creme processado, produtos nutricionais, produtos lácteos recombinados, leite em pó com alto teor proteico, fórmulas lácteas infantis, iogurte com alto teor proteico, sorvetes, bebidas lácteas, bebidas esportivas e produtos relacionados à saúde4,6. Ademais, MPC pode ser utilizado na padronização de proteínas, formulações de produtos com redução de gordura e lactose, nutrição geriátrica, fórmulas de acompanhamento, produtos medicinais, nutricionais e especiais, desenvolvimento de bebidas e alimentos para nutrição esportiva, substitutos de refeições e gerenciamento de peso. Também pode ser utilizado em sopas e molhos, produtos cárneos, produtos de panificação, confeitaria, chocolate, branqueador de café, sobremesas, coberturas batidas, leite recombinado, nutrição enteral e clínica. MPC pode ser usado para melhorar textura, aumentar o valor nutricional, promover melhor propriedade emulsificante, aumentar o teor proteico e prolongar a vida útil de produtos alimentares3,7.
U.S. Dairy Export Council (USDEC)3 apresentou algumas aplicações do MPC, apresentados na Tabela 2.
Tabela 2. Exemplos de aplicação de MPC. Dados 3
Segundo Future Market Insights, por ser uma proteína completa em aminoácidos essenciais, o MPC é uma excelente opção para suplementos alimentares6. Portanto, o mercado de alimentos enriquecidos e de suplementos é a maior oportunidade de crescimento do consumo de MPC.
O MPC em geral também desempenha função de emulsificante e estruturante sendo, portanto, um excelente ingrediente para indústria de alimentos, fármacos e cosméticos6.
O MPC também apresenta uma estrutura propícia para servir de carreador de bioativos e fármacos, para liberação controlada da droga no organismo. Cápsulas feitas a partir de MPC apresentam excelentes propriedades como propriedade gelificante e alta capacidade de proteção do composto6.
Em resumo, algumas propriedades do MPC podem ser listadas, a saber: agente de texturização, agente de revestimento, agente vinculante, agende enchimento, agente emulsificante, aumento de viscosidade e capacidade de retenção de água. Já a nível nutricional, formulações com apelo de alto teor proteico em geral.
A Tabela 3 apresenta importantes aplicações das MP por setor:
Tabela 3. Aplicações do uso de MPC e MPI
Referências:
1 Statistics Redesign | Passport (euromonitor.com) Acesso: 12/03/2024
2 Meena, G. S., Singh, A. K., Panjagari, N. R., & Arora, S. (2017). Milk protein concentrates: opportunities and challenges. Journal of food science and technology, 54, 3010-3024.
3 Search | U.S. Dairy Export Council (usdec.org) Acesso: 14/03/2024
4 McCarthy, N. A., Kelly, P. M., Maher, P. G., & Fenelon, M. A. (2014). Dissolution of milk protein concentrate (MPC) powders by ultrasonication. Journal of Food Engineering, 126, 142-148.
5 Relatório de tamanho e participação do mercado de concentrado de proteína de leite (MPC), 2030 (businessresearchinsights.com) Acesso: 14/03/2024
6 Milk Protein Market Size, Industry Share & Trends – 2032 (futuremarketinsights.com) Acesso: 14/03/2024
7 Milk Protein Market Size & Share Analysis – Industry Research Report – Growth Trends (mordorintelligence.com) Acesso: 12/04/2024
8 Milk Protein Market Size & Share Analysis – Industry Research Report – Growth Trends (mordorintelligence.com) Acesso: 12/04/2024
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